AVISO DE CANCELAMENTO DAS REUNIÕES EXTRAORDINÁRIAS - 19/12/2024
Como responsável pela direção e ordem dos trabalhos institucionais da Câmara Municipal de Arcos – e com endosso dos vereadores abaixo assinados –, nos termos do artigo 43 de seu Regimento Interno, determino o cancelamento das reuniões extraordinárias marcadas para o dia 19 de dezembro de 2024, destinadas a dar entrada e a realizar a discussão/votação do Projeto de Lei Ordinária n° 020/2024, relativo à concessão de abono pecuniário natalino aos servidores municipais e discussão e votação Projetos de Lei Ordinárias nº 020/2024, nº 021/2024, nº 022/2024, nº 023/2024, nº 024/2024 e nº 025/2024.
Embora as reuniões extraordinárias tenham sido convocadas anteriormente por esta presidência, o cancelamento de ambas se impõe, à luz do artigo 125, VI, da Lei Orgânica de Arcos, por se ter concluído que a proposta apresentada é contrária à Lei das Eleições, à Lei de Responsabilidade Fiscal, ao Código Penal e às finanças públicas (artigo 163, I, da Constituição Federal).
Por dever de retidão e transparência, passa-se a expor nos parágrafos seguintes, de maneira clara e detalhada, todos os fundamentos legais que impedem a proposição do abono pecuniário natalino, considerando que sua eventual e respectiva concessão tem o potencial de configurar a conduta vedada pelo art. 73, VIII, da Lei 9.504/97, o ato de improbidade administrativa por violação ao art. 21, II, da Lei Complementar 101/2000 e o crime do art. 359-G do Código Penal.
Antes, porém, é preciso registrar que não se ignora nem se negligencia o merecimento e a justeza em se conceder um abono natalino aos servidores municipais, que laboram dedicada e cotidianamente para garantir os mais diversos e indispensáveis serviços públicos aos munícipes. Contudo, da mesma forma que o exercício das funções públicas é realizado corretamente por tais agentes, qualquer verba a eles concedida não pode prescindir da mais absoluta regularidade.
Feita essa necessária ressalva, é oportuno lembrar toda a sucessão de atos relativa à apresentação do Projeto de Lei Ordinária n° 020/2024.
Pois bem. A proposição legislativa foi protocolada nesta Casa somente após o encerramento da sessão legislativa ordinária (10/12/2024).
Ainda assim, a Comissão de Legislação Justiça e Redação Final, atenciosa ao pleito, solicitou ao prefeito municipal, a fim de subsidiar a análise do projeto, que informasse a natureza jurídica do abono natalino, para avaliar se acarretaria aumento de despesa com pessoal.
Em resposta, Sua Excelência e sua douta assessora jurídica afirmaram que a concessão pretendida não aumentaria a despesa com pessoal, visto que “o abono pecuniário natalino não tem caráter remuneratório, pois não é uma gratificação por serviços prestados, e sim natureza jurídica indenizatória”. Outrossim, o prefeito aduziu que o TCE/MG (processo n° 980459) já concluíra no sentido da “exclusão dessas verbas no cômputo da folha de pagamento dos servidores públicos”. Ademais, afirmou que este também seria o entendimento jurisprudencial, tendo citado dois julgados do Tribunal Superior do Trabalho.
Ato contínuo, o Sindicato dos Trabalhadores Municipais de Arcos encaminhou ofício a esta edilidade, no qual, semelhantemente ao quanto narrado no parágrafo anterior, pontuou que “em que pese o Projeto de Lei prever aumento com pessoal nos últimos 180 (cento e oitenta dias) [sic] anteriores ao final do mandato, o valor será pago em uma única parcela ainda no ano de 2024, não havendo a criação de despesas que se prolongam no decorrer do tempo”.
No que concerne à alegação expressa do Executivo municipal acerca da natureza indenizatória do abono em questão – reafirmada implicitamente pela entidade sindical –, por maior que seja o esforço argumentativo e interpretativo, não se pode atribuir sentidos arbitrários às palavras, dando a elas o sentido que se quer.
Nesse passo, ao ler o processo da Corte de Contas indicado pelo Poder Executivo, percebe-se que dele não consta qualquer alusão ao caráter indenizatório correspondente a abono eventual concedido pela Administração Pública. Ele dispõe, na verdade, que verbas como as férias indenizadas e a conversão de férias em pecúnia não devem ser computadas na folha de pagamento, por configurarem – essas, sim – pagamentos de cunho indenizatório.
Ainda segundo o TCE/MG, “para que a lei legitime a verba de caráter indenizatório, a única exigência, além da adequação do nomen iuris, é a de que seu pagamento esteja vinculado à comprovação de gastos realizados pelo servidor”. (Consulta n° 841256/2012). No caso, não há qualquer comprovação de despesas a serem ressarcidas que possam ser designadas como indenizatórias.
Logo, independentemente da nomenclatura que se queira conferir ao abono, a denominação atribuída ao provento, por si só, não afasta a sua natureza remuneratória. Com efeito, o inciso II da Lei Federal 4.506/1964 define que são classificados como rendimentos do trabalho assalariado todas as espécies de remuneração por trabalho ou serviços prestados no exercício dos empregos, cargos ou funções, tais como: adicionais, extraordinários, suplementações, abonos, bonificações, gorjeta.
Em complemento, a autorizada doutrina de JOSÉ DOS SANTOS CARVALHO FILHO[1] ensina que “o fato de ser permanente ou transitória a vantagem pecuniária não a descaracteriza como parcela remuneratória”.
Por sua vez, em relação aos dois entendimentos jurisprudenciais do Tribunal Superior do Trabalho citados pelo prefeito municipal – os quais, segundo Sua Excelência, indicam que tais verbas são indenizatórias –, nota-se que ambos os acórdãos se referem a convenções coletivas de trabalhadores celetistas. No entanto, de acordo com a Súmula 679 do STF, “a fixação de vencimentos dos servidores públicos não pode ser objeto de convenção coletiva”.
Ultrapassados os argumentos supraditos, é de rigor demonstrar a potencialidade deste projeto de lei, se aprovado, configurar a conduta vedada pelo art. 73, VIII, da Lei 9.504/97, o ato de improbidade administrativa por violação ao art. 21, II, da Lei Complementar 101/2000 e o crime do art. 359-G do Código Penal.
Em relação à primeira conduta exposta, verifica-se que o art. 73, VIII, da Lei no 9.504/97 veda ao agente público fazer, na circunscrição do pleito, revisão geral da remuneração (lato sensu) dos servidores públicos que exceda a recomposição da perda de seu poder aquisitivo ao longo do ano da eleição, a partir do início do prazo estabelecido no art. 70 do mesmo diploma legal até a posse dos eleitos, sob pena de cassação do registro ou do diploma.
Quanto ao segundo ilícito evidenciado, observa-se que o artigo 21, inciso II, da Lei de Responsabilidade Fiscal assevera ser nulo o ato de que resulte aumento da despesa com pessoal nos 180 (cento e oitenta) dias anteriores ao final do mandato do titular de Poder.
Ao interpretar esse comando legal, o Tribunal de Contas de Minas Gerais (vide Consulta n° 885888/2013), adotou o seguinte posicionamento: “não é permitido o aumento de despesa com pessoal nos últimos cento e oitenta dias do mandato, a teor do disposto no parágrafo único do art. 21 da Lei Complementar nº 101, de 2000, Lei de Responsabilidade Fiscal”.
Também se observa que a posição da Corte de Contas é idêntica à do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, para o qual "é nulo de pleno direito o ato de que resulte aumento da despesa com pessoal expedido nos cento e oitenta dias anteriores ao final do mandato do titular do respectivo Poder” (TJMG - Proc. nº 1.0708.09.030938-4/001. Relator(a): Des.(a) Heloisa Combat. Julgamento: 26/10/2010. publicação da súmula: 17/11/2010).
Igualmente, o Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Recurso Especial n° 1.170.241/MS, concluiu que “a LC n. 101/00 é expressa ao vedar a mera expedição, nos 180 dias anteriores ao final do mandato do titular do respectivo Poder, de ato que resulte o aumento de despesa com pessoal”.
Por conseguinte, infere-se que a concessão de um abono pecuniário a cada servidor público é obstada pela proibição legal indicada, na medida em que o projeto, que cria uma nova vantagem ao funcionalismo público – gerando, portanto, uma nova despesa aos cofres públicos, tanto assim que se necessita de uma lei para criá-la –, somente aportou na Câmara Municipal no dia 10 de dezembro de 2024, ou seja, nos últimos 180 dias do mandato atual.
Cumpre destacar, na oportunidade, que a infração ao sobredito dispositivo configura ato de improbidade administrativa, conforme artigo 73 da Lei Complementar 101/2000. Assim, repise-se, por mais que se reconheça a justeza em se conceder um abono natalino aos servidores municipais, sua concessão depende de sua própria lisura e idoneidade, não podendo ser concedida de maneira ilícita, sobretudo pelo dever, como agente político, de agir em estrita observância às leis da República.
Frise-se, por ser relevante, que a prática do referido ato de improbidade administrativa, caso aferida, resulta, conforme artigo 12, II, da Lei n° 8.429/1992, na pena de perda da função pública, suspensão dos direitos políticos até 12 (doze) anos, pagamento de multa civil equivalente ao valor do dano e proibição de contratar com o poder público ou de receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo não superior a 12 (doze) anos.
O terceiro e último ilícito demonstrado prevê, de modo ainda mais gravoso, que as condutas de “ordenar, autorizar ou executar ato que acarrete aumento de despesa total com pessoal, nos cento e oitenta dias anteriores ao final do mandato ou da legislatura” configuram crime contra as finanças públicas, o qual resulta em uma pena de prisão de 1 a 4 anos.
Em suma, pois, depreende-se que todas as condutas ilícitas evidenciadas lesam, no mínimo por via reflexa, a Constituição da República no capítulo atinente à disciplina das finanças públicas.
Com relação aos Projetos de Lei Ordinárias nº 020/2024, nº 021/2024, nº 022/2024, nº 023/2024, nº 024/2024 e nº 025/2024, existem inviabilidades técnicas e jurídicas para a análise e tramitação dos mesmos, tendo em vista o início do período de recesso parlamentar.
Por tudo isso, como presidente da Câmara Municipal de Arcos, determino e reafirmo – com endosso dos vereadores abaixo assinados –, à luz do artigo 125, VI, da Lei Orgânica Municipal, o cancelamento das reuniões extraordinárias marcadas para o dia 19 de dezembro de 2024.
FLÁVIO CORREIA DA SILVA
Presidente da Câmara Municipal de Arcos/MG
ADEMAR AURELIANO DE MEDEIROS CARLOS ANTÔNIO DA SILVA
Vereador Vereador
JOÃO PAULO FERREIRA JOSÉ CALIXTO DA FONSECA
Vereador Vereador
KÁTIA MATEUS DE MOURA SOUSA RONALDO GASPAR RIBEIRO
Vereador Vereador